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brar o desdouro. Commettida a fraqueza de sentar-se nos bancos das aulas ao lado dos filhos dos commerciantes e lavradores, devia-se pelo menos seguir o exemplo do mano bacharel do Cruzeiro, o qual evitára a circumstancia aggravante de servir depois para alguma coisa.

Formava grupo á parte frei Januario em animado colloquio com outros dois padres, tambem appensos a casas fidalgas, e igualmente fervorosos na defeza dos legitimos direitos da nobreza e abominadores dos pedreiros livres.

Mauricio, na companhia dos rapazes no terraço, entre os quaes se achavam os dois primos do Cruzeiro, tomava parte nas suas diversões, mas sem perder certo ar de melancolia, que lhe ficára das scenas da vespera.

Jorge attendia a todos, mas n'elle era ainda mais evidente do que em Mauricio a preoccupação de espirito.


Desde a vespera os dois irmãos não haviam trocado uma palavra. Gabriella notára-o, e desconfiava de que alguma coisa se tivesse passado entre elles.

Não deixava porém a baroneza de desempenhar pela sua parte, com superior sciencia, o papel que lhe cumpria, como a pessoa em honra de quem tinha logar a festa de familia. Ia de grupo a grupo, tendo uma amabilidade certeira para cada individuo, e conseguindo desvanecer com as inebriantes inhalações de lisonja a superciliosa desconfiança que os seus ares de côrte da actualidade despertavam n'aquelles espiritos, escrupulosos respeitadores da côrte velha.

Houve uma circumstancia que excitou a curiosidade da baroneza. Notára ella que a maior parte dos rapazes, com quem os manos do Cruzeiro haviam conversado e rido, seguiam Jorge com olhares maliciosos, e que sempre que este lhes voltava costas, trocavam uns com outros risos mal suffocados. Da roda dos rapazes communicára-se o mesmo effeito á das raparigas, por intermedio dos colloquios de alguns namorados, e dentro em pouco viu-as olharem tambem para Jorge com certa