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OS GATOS 11 d’uma cor vermelho sangue, cortada de verdes bronze, ou sujo, ou mais vivo, ou mais violento, e sobre este casco de gangas ferruginosas, da côr tragica das guerras e dos poentes, pinheiros direitos, decapitados nas cópas, esgalhados lugubremente nas braçadas, altercando entre si como cruzes que se disputam um mau ladrão para um supplicio. Pela direita toda, sempre a serra, com as suas massas d’argillas fruscas, areias quaternarias, calhaus conglomerados em cabeçorras nuas lá nos pincaros —a serra a despenhar-se sobre o viandante, cheia de cicatrizes dos tiros dos britadores, lascada a prumo por machados de cyclopes furiosos, e curveteando sempre, e desdobrando-se com um extraordinario pictoresco d’agulhas, creneis, contrafortes d’apoio, linhas, socalcos, fustigada da luz, zebrada de nevoeiro, em destaque crueis e escuros rhembrandtescos e d’uma infinita poesia d’ajoelhar e dizer os hymnos d’hinos d'Eurico sobre o Calpe.! Tal a visão da terra. Para exprimir a do rio, necessario se faz fluidar tintas d’estylo té um inverosimil lance de gradações quasi incorporeas, ter ligeirezas de tom capazes d’exprimir não sensações, mas sonhos de sensações, almas de cores, tão vaporosa immaterialidade se exhala dessa marinha unica de harmonia, embaladora d’idylio, a entredizer, num murmurio de beijos, como o Hamlet:

« ... Morrer, dormir, sonhar talvez!... »

— Dormir, sonhar... Oh! como a bahia ganha, entre Setubal e Troia, tons de saphira e azul fer-