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OS MAIAS

uma ferradura de opalas! Era outro Ega, um Ega dandy, vistoso, paramentado, artificial e com pó d’arroz — ­e Carlos deixou emfim escapar a exclamação impaciente que lhe bailava nos labios:

— ­Ega, que extraordinario casaco!

Por aquelle sol macio e morno de um fim de outono portuguez, o Ega, o antigo bohemio de batina esfarrapada, trazia uma pelliça, uma sumptuosa pelliça de principe russo, agasalho de trenò e de neve, ampla, longa, com alamares trespassados á Brandeburgo, e pondo-lhe em torno do pescoço esganiçado e dos pulsos de thisico uma rica e fôfa espessura de pelles de marta.

— ­É uma boa pelliça, hein? disse elle logo, erguendo-se, abrindo-a, exhibindo a opulencia do forro. Mandei-a vir pelo Strauss... Beneficios da epidemia.

— ­Como podes tu supportar isso?

— ­É um bocado pesada, mas tenho andado constipado.

Tornou a recostar-se no sophá, adiantando o sapato de verniz muito bicudo, e, de monocolo no olho, examinou o gabinete.

— ­E tu que fazes? conta-me lá... Tens isto explendido!

Carlos fallou dos seus planos, de altas idéas de trabalho, das obras do laboratorio...

— ­Um momento, quanto te custou tudo isto? exclamou o Ega interrompendo-o, erguendo-se para ir apalpar o velludo dos reposteiros, mirar os torneados da secretária de pau preto.