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OS MAIAS

jantar aqui, soirée acolá, umas aventurasitas... Não tenho podido cá vir, deixei-lhes só bilhetes; mas trago-a d’olho, que ella demora-se... Talvez venha cá ámanhã, estou cá agora a sentir umas cocegas... E se me pilho só com ella, zás, ferro-lhe logo um beijo! Que eu cá, não sei se v. ex.ª é a mesma cousa, mas eu cá, com mulheres, a minha theoria é esta: attracão! Eu cá, é logo: attracão!

N’esse momento Alencar voltava do estanco, de charuto na boca. Damaso despediu-se, atirando muito alto ao cocheiro, para que Carlos ouvisse, a adresse da Morelli, a segunda dama de S. Carlos.

— ­Bom rapaz, este Damaso, dizia Alencar, travando de braço de Carlos, ao seguirem ambos pelo Aterro. É lá muito dos Cohens, muito querido na sociedade. Rapaz de fortuna, filho do velho Silva, o agiota, que esfolou muito teu pae; e a mim tambem. Mas elle assigna Salcede; talvez nome da mãe; ou talvez inventado. Bom rapaz... O pae era um velhaco! Parece que estou a ouvir o Pedro dizer-lhe com o seu ar de fidalgo, que o tinha e do grande: «Silva judeu, dinheiro, e a rôdo!»... Outros tempos, meu Carlos, grandes tempos. Tempos de gente!

E então por esse longo Aterro, triste no ar escuro, com as luzes do gaz dormente luzindo em fila d’enterro, Alencar foi fallando d’esses «grandes tempos» da sua mocidade e da mocidade de Pedro; e, atravéz das suas phrases de lyrico, Carlos sentia vir como um aroma antiquado d’esse mundo defunto... Era quando os rapazes ainda tinham um resto de calor das