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OS MAIAS

A face da boa ingleza illuminou-se. Oh! era tão bom, ter emfim com quem se entender! A menina estava muito melhor! Oh, o doutor vinha livral-a d’uma responsabilidade!...

Abriu o reposteiro, fêl-o penetrar n’um quarto com as janellas todas cerradas, onde elle apenas distinguiu a fórma d’um grande leito e o brilho de cristaes n’um toucador. Perguntou para que eram aquellas trevas?

Miss Sarah pensara que a escuridão faria bem à menina, e a adormeceria. E trouxera-a ali para o quarto da mamã, por ser mais largo e mais arejado.

Carlos fez abrir as janellas: e, quando a grande luz entrou, ao avistar a pequena no leito, sob os cortinados abertos, não conteve a sua admiração.

— ­Que linda creança!

E ficou um instante a contemplal-a, n’um enlevo d’artista, pensando que os brancos mais mimosos, mais ricos, sob a mais sabia combinação de luz, não egualariam a pallidez eburnea d’aquella pelle maravilhosa: e esta adoravel brancura era ainda realçada por um cabello negro, tenebroso, forte, que reluzia sob a rede. Os seus por dois olhos grandes, d’um azul profundo e liquido, pareciam n’esse instante maiores, muito serios, e muito abertos para elle.

Estava encostada a um grande travesseiro, toda quieta, com o susto ainda da dôr, perdida n’aquelle vasto leito, e apertando nos braços uma enorme boneca paramentada, de pello riçado, d’olhos tambem azues e arregalados tambem.