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Página:Os Maias - Volume 1.djvu/402

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OS MAIAS

dizia — ­para que, se elle o não queria para boticario?

Depois d’um silencio, as duas senhoras ergueram-se ao mesmo tempo; e houve um murmurio de beijos, um frou-frou de sedas.

Carlos ficou só com a sr.ª condessa, que reoccupara a sua cadeira côr de rosa.

Immediatamente ella perguntou pelo Ega.

— ­Coitado, lá está para Celorico.

Ella protestou, com um lindo riso, contra aquella phrase tão feia «lá está para Celorico» Não, não queria... Coitado do Ega! Merecia uma melhor oração funebre. Celorico era horrível para um fim de romance...

— ­De certo, exclamou Carlos, rindo tambem, era mais bello dizer-se: lá está para Jerusalem!

N’esse momento o criado annunciou um nome, e appareceu o amigo Telles da Gama, um intimo da casa. Quando soube que o conde devia estar ainda batalhando sobre a Reforma da Instrucção, levou as mãos á cabeça como lamentando um tão feio desperdicio de tempo, e não se quiz demorar. Não, nem mesmo o excellente chá da sr.ª condessa o tentava. A verdade era que estava tão abandonado da graça de Deus, perdera de tal modo o sentimento das cousas bellas, que entrara, não para vêr a sr.ª condessa — ­mas simplesmente fallar ao conde. Então ella teve um bonito ar de princeza offendida, perguntou a Carlos se uma tão rude sinceridade de montanhez não fazia saudades das maneiras polidas do antigo regimen.