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OS MAIAS

entre as flores e tão perfumado como ellas: comparava-a a uma nobre dama da Syria dando a gota de agua da sua bilha ao cavalleiro arabe, ferido na estrada ardente; comparava-a á Beatriz do Dante.

Isto affigurou-se a todos de uma rara distincção, e, como disse o Alencar, um rasgo á Byron.

Depois, na soirée do baptisado de Carlos Eduardo, dada d’ahi a uma semana, o napolitano mostrou-se, e impressionou tudo. Era um homem esplendido, feito como um Apollo, de uma pallidez de marmore rico: a sua barba curta e frisada, os seus longos cabellos castanhos, cabellos de mulher, ondeados e com reflexos de ouro, apartados á nazarena — ­davam-lhe realmente, como dizia a Arlesianna, uma physionomia de bello Christo.

Dançou apenas uma contradança com Maria, e pareceu, na verdade, um pouco taciturno e orgulhoso: mas tudo n’elle fascinava, a sua figura, o seu mysterio, até o seu nome de Tancredo. Muitos corações de mulher palpitavam quando elle, encostado a uma hombreira, de claque na mão, uma melancolia na face, exhalando o encanto pathetico de um condemnado á morte, derramava lentamente pela sala o langor sombrio do seu olhar de velludo. A marqueza d’Alvenga, para o examinar de perto, pediu o braço a Pedro, e foi applicar-lhe, como a um marmore de museo, a sua luneta de ouro.

— ­É de appetite! exclamou ella. É uma imagem!... E são amigos, são amigos, Pedro?

— ­Somos como dois irmãos d’armas, minha senhora.