Era um papel já sujo, e desde essa manhã de certo muitas vezes relido, amarrotado com furia. Continha estas palavras:
«É uma fatalidade, parto para sempre com Tancredo, esquece-me que não sou digna de ti, e levo a Maria que me não posso separar d’ella.»
— E o pequeno, onde está o pequeno? exclamou Affonso.
Pedro pareceu recordar-se:
— Está lá dentro com a ama, trouxe-o na sege.
O velho correu, logo; e d’ahi a pouco apparecia, erguendo nos braços o pequeno, na sua longa capa branca de franjas e a sua touca de rendas. Era gordo, de olhos muito negros, com uma adoravel bochecha fresca e côr de rosa. Todo elle ria, grulhando, agitando o seu guiso de prata. A ama não passou da porta, tristonha, com os olhos no tapete e uma trouxasinha na mão.
Affonso sentou-se lentamente na sua poltrona, e accommodou o neto no collo. Os olhos enchiam-se-lhe de uma bella luz de ternura; parecia esquecer a agonia do filho, a vergonha domestica; agora só havia ali aquella facesinha tenra, que se lhe babava nos braços...
— Como se chama elle?
— Carlos Eduardo, murmurou a ama.
— Carlos Eduardo, hein?
Ficou a olhal-o muito tempo, como procurando n’elle os signaes da sua raça: depois tomou-lhe na sua as duas mãosinhas vermelhas que não largavam