Página:Os Maias - Volume 1.djvu/71

Wikisource, a biblioteca livre
OS MAIAS
61

N’esse momento a sineta do jantar começou a tocar lentamente, ao fundo do corredor.

— ­Ainda janta cedo, hein? disse Pedro.

Teve um suspiro cançado e lento, murmurou:

— ­Nós jantavamos ás sete...

Quiz então que o pae fosse para a mesa. Não havia motivo para que se não jantasse. Elle ia um bocado acima, ao seu antigo quarto de solteiro... Ainda lá tinha a cama, não é verdade? Não, não queria tomar nada...

— ­O Teixeira que me leve um calice de genebra... Ainda cá está oTeixeira, coitado!

E vendo Affonso sentado, repetiu, já impaciente:

— ­Vá jantar meu pae, vá jantar, pelo amor de Deus...

Saiu. O pae ouviu-lhe os passos por cima, e o ruido de janellas desabridamente abertas. Foi então andando para a sala de jantar, onde os criados que pela ama sabiam de certo o desgosto se moviam em pontas de pés, com a lentidão contristada d’uma casa onde ha morte. Affonso sentou-se á mesa só; mas já lá estava outra vez o talher de Pedro; rosas de inverno esfolhavam-se n’um vaso do Japão; e o velho papagaio agitado com a chuva mexia-se furiosamente no poleiro. ’

Affonso tomou uma colher de sopa, depois rolou a sua poltrona para junto do fogão; e ali ficou envolvido pouco a pouco n’aquelle melancolico crepusculo de dezembro, com os olhos no lume, escutando o sudoeste contra as vidraças, pensando em todas as cousas terriveis