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OS MAIAS

desattenção rumorosa, atabalhoava as notas, n’uma debandada.

— Fiasco completo, declarou Carlos que se aproximára do Ega e do rancho.

Foi para D. Maria da Cunha uma alegria, uma surpreza! Até que emfim se via o snr. Carlos da Maia, o Principe Tenebroso! Que fizera elle durante esse verão? Todo o mundo a esperal-o em Cintra, alguem mesmo com anciedade... Um chut furioso do amador de barbas grisalhas emmudeceu-a. E justamente Cruges, depois de bater dois accordes bruscos, arredára o môcho, esgueirava-se do estrado, enxugando as mãos ao lenço. Aqui e além algumas palmas resoaram, molles e de cortezia, entre um grande murmurio d’allivio. E o Ega e Carlos correram á porta, onde já esperavam o marquez, o Craft, o Taveira — para abraçar, consolar o pobre Cruges que tremia todo, com os olhos esgazeados.

E immediatamente, no silencio attento que redominava, um sujeito muito magro, muito alto, surgiu no tablado, com um manuscripto na mão. Alguem ao lado do Ega disse que era o Prata, que ia fallar sobre o Estado agricola da provincia do Minho. Atraz, um criado veio collocar sobre a mesa um candelabro de duas velas: o Prata, d’ilharga para a luz, mergulhou no caderno: e d’entre o perfil triste e as folhas largas um rumor lento foi escorrendo, rumor de reza n’uma somnolencia de novena, onde por vezes destacavam como gemidos — «riqueza