Página:Os Maias - Volume 2.pdf/66

Wikisource, a biblioteca livre
56
OS MAIAS

terceiro entre os lençoes conjugaes, se o mundo chama a isso sentimentalmente um romance, e os poetas o cantam em estrophes d’ouro?

— E a proposito, a tua comedia, o Lodaçal? perguntou Carlos, que entrára um instante para a alcova de banho.

— Abandonei-a, disse o Ega. Era feroz de mais... E além d’isso fazia-me remexer na podridão lisboeta, mergulhar outra vez na sargeta humana... Affligia-me...

Parou diante do grande espelho, deu um olhar descontente ao seu jaquetão claro e ás botas com mau verniz.

— Preciso enfardelar-me de novo, Carlinhos... O Poole naturalmente mandou-te fato de verão, hei de querer examinar esses córtes da alta civilisação... Não ha negal-o, diabo, esta minha linha está chinfrim!

Passou uma escova pelo bigode, e continuou fallando para dentro, para a alcova de banho:

— Pois, menino, eu agora o que necessito é o regimen da Chimera. Vou-me atirar outra vez ás Memorias. Ha de se fazer ahi uma quantidade d’arte colossal n’esse quarto que me destinas, diante de Velasquez... E a proposito, é necessario ir comprimentar o velho Affonso, uma vez que elle me vai dar o pão, o tecto, e a enxerga...

Foram encontrar Affonso da Maia no escriptorio, na sua velha poltrona, com um antigo volume da Illustração franceza aberto sobre os joelhos,