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Brincavam brandamente em doce calma.
Imagem da tristeza eu sou valente,
Que trago o lucto impresso no semblante.
A causa d’este mal, leitor querido,
Eu passo relatar inda ferido.

De jovem pudibunda casta e bella,
Por quem paixão nutri, a mais singela,
E que hoje de hymineu presa nos laços
Entrega-se aos prazeres n’outros braços,
Guardava com amor, que me mantinha,
A fagueira e mimosa cadellinha.
No meu leito dormia; si velava,
A testa me lambia, a lisa calva;
Lambia-me o nariz, a bocca.... tudo,
Ao ver-me resomnar tam quedo e mudo.
Té dos pés me lamber não tinha pejo,
Julgando em cada calo ter um queijo.

Fazia o meu prazer, o meu encanto,
Nos olhos me estancava o salso pranto;
E penso que cadella tão querida
Ainda ninguem teve nesta vida
Mas ao monstro voraz, que ròe penedos,
Aprouve de tornar meus dias tredos,
Matando aquella prenda, que eu amava,
Qual Hercules deixou-me sem a clava;
E se ferido ainda estou vivendo
E’ so para sentir que vou morrendo.

Não tenho mais prazer, gostos não tenho,
Que só dar pasto á magoa é meu empenho ;
Thomazinho não sou, qual d’antes era,
O rosto está rugoso—erma tapera.
E quem, notando golpe tão profundo,
Não dirá:—Nada somos n’este mundo !
Mas como quem pertence a máo senhor,
De si dispor não póde a seu sabor,