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MACBETH


FOI no tempo de Filipe II, trágico mocho do Catolicismo, que Shakespeare criou o seu drama épico de Macbeth.

É desde então que aquela figura, que exala noite e humidade, erra pelo enorme céu negro, lívida no meio das tempestades, alumiada e crescida por um estranho reflexo de saques e de incêndios, enquanto os abutres, os corvos, os milhafres, os gaviões, as corujas voam em círculos sobre a sua trágica cabeça esguedelhada. As outras imaginações nocturnas do poeta, que se chamam Hamlet, Lear, Otelo e pisam com pé trágico o solo augusto da epopeia, todas têm junto de si o doce corpo de uma mulher, para lhes embalar no seio as angústias tenebrosas, como num leito misterioso, para lhes fazer subir por vezes ao rosto a serenidade augusta do bem.

Essas formas femininas andam impalpavelmente, como radiações de luz, em redor daquelas terríveis cariátides do mal: elas derramam-se sobre aquelas almas nocturnas, como umas auroras vivas, cheias de meiguices, de orvalhos, de