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Página:Prosas bárbaras (1912).djvu/76

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as mulheres de seios fecundos, matar a pátria corre desvairado, toma uma floresta e vem esmagar a feroz criatura sob um desabamento da santa natureza: e aquele castigo passa com o ruído terrível do carro da justiça.

Este Adão do mal tem uma Eva monstruosa — Lady Macbeth. Lady Macbeth é a serenidade do mal. Ela, com la sua atitude soberana e bárbara, tem a vaga semelhança duma Juno homerica. Tem em si toda a grandiosa rigidez, todas as frias austeridades da natureza do Norte. Ela é a energia selvagem, que de longe conduz as batalhas. Ela passa no drama como sacerdotisa do mal, predestinada e serena: até às vezes parece flutuar, no seu olhar frio, não sei que fúnebre resignação: as cóleras e os castigos têm quase piedade daquela mulher estéril. Ela não tem o amor, não tem a consolação, não tem a melancolia, não tem a maternidade. Alguém, feroz e desconhecido, lhe tirou aqueles amolecimentos onde há lágrimas, para lhe poder conservar a atitude hirta e rígida do mal.

Lady Macbeth é como uma estátua do crime, feita de mármores e de bronzes, e erguida ao longe numa lividez silenciosa, tendo por pedestal a noite. De vez em quando concebe, com lascivos estremecimentos de alma, as opressões e as violências, e vem então lenta, deixa cair da sua mão estendida as agonias e as destruições, acende com um olhar as sinistras queimadas pela planície, e volta para os lados da noite e da humidade, arrastando o seu manto, que faz a cada passo como que uma onda negra e húmida de sangue, que a segue.