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do que ver em que o artificio, no corpo feminino, para garantir o actoamoroso, poderia ser nocivo á outra especie. Porém, emquanto não está demostrado que as nossas especies carecem, particularmente, deste artificio ou que, o ultimo seria mais depressa nocivo do que util ás outras especies, a sua presença, sómente nestes poucos Amphipodes, terá de ser encarada, não como a obra de premeditado desejo mas, como a de um accidente, tornado uso pela selecção natural. Sob a ultima hypothese sua occurrencia isolada é intelligivel, ao contrario, não podemos perceber porque o Creador munio, só estas poucas especies, de um apparelho que elle julgou inteiramente compativel com o <<plano geral de estructura» dos Amphipodes e, entretanto, recusou-o aos outros que vivem sob as mesmas condições externas e os egualam, ainda, na extraordinaria lascivia. Associados, ou na immediata visinhança das duas especies de Melita, vivem duas especies Allorchestes, cujos pares são encontrados mais frequentemente do que os animaes isolados; e entretanto, suas femeas não mostram o menor traço dos processos supra-mencionados, das lamellas coxaes.

Fig. 11 — Lamellas coxaes do mesmo par de patas de M. insatiabilis.

Este caso, penso eu, deve ser trazido em contrario a concepção defendida, com tanto talento quanto saber, por Agassiz, de que as especies são pensamentos do Creador, corporificados; e, com este, todos os exemplos similares, em que os arranjos que seriam egualmente beneficos, para todas as especies de um grupo, faltem á maioria e só sejão conferidos á poucos e determinados favoritos que, não parecem precisar d'elles algo mais do que os restantes.

FRITZ MULLER.


Na "Serra das Antas"


E' quasi a prumo a serra alpestre. E a trilha dura,
Torta em rude espiral, transponho-a salto a salto,
Aqui se afunda o solo em cova horrenda e escura
Além se empina a pique um muro de basalto.

A rocha escalda ao sol. Trepo a escarpa mais alto,
Mais alto... e o pico ascendo. Em cima o céo fulgura...
E tonto, o olhar baixando ao valle, do planalto,
Recúo a arfar no horror da vertigem da altura.

E, ah! que deslumbramento! Um sussurro abrasado
Enche a varzea radiante. A passarada vôa
Na ampla gloria da luz. O vento agita as plantas.

E ermo, torvo, em cachões, reboando atropelado,
Num retumbo infernal que a bruta serra atrôa
Como passa o tufão, passa o "Rio das Antas."

Rio Grande do Sul.
VICTOR SILVA.