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a imperiosa fascinação do olhar, murmurou-lhe ao ouvido: Venha commigo para Hespanha ; amal-a-hei sempre, sempre!

— Sim! balbuciou Severina, na inconsciencia da commoção que a prostrava inerte, que a cegava e entontecia.

Então elle beijou-a doidamente, supplicando-lhe que o esperasse ás 11 horas, explicando-lhe que n'essa mesma noite partiriam para Lisboa.

Durante as horas que se seguiram, Severina moveu-se como uma somnambula, indifferente a tudo que a rodeava.

A's 11 horas, José de Lumbrelas fez o signal convencionado.

Severina ergueu-se na sua pallidez espectral e abriu automaticamente a porta, absorta no mesmo extasiante sonho, atravéz do qual pronunciára a palavra que deveria decidir de todo o seu destino.

Lá fóra, o luar argentava a linha das casas, a massa escura dos pinheiros e o perfil granitico dos rochedos, e na doce e rcligiosa serenidade da noite estrellada o mar cantava o seu requiem gemebundo.

Elle enlaçou-a nos braços sofregamente e transpôz o limiar do humilde casinholo, onde o velho pescador e as tres creanças dormiam socegadamente.

De repente, uma fresca voz de creança gritou :

— Tia Severina, deita-te ao pé de mim, tenho medo!

Ella estremeceu, sacudida pela violenta reacção de todo o seu organismo, acordado á imperiosa voz do dever.

Recuou aterrada, esfregou os olhos e levantando