Página:Ultimas Paginas (Eça de Queirós, 1912).djvu/122

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Alta noite acordou: - um som lento, desolado, de buzina, caía de rocha em rocha pelo silêncio da serra. Era como o apelo de uma coração aflito: - e imediatamente o prior, correndo de dentro da cabana, se atirou de joelhos diante da cruz, rezando, com furor tumultuoso. De certo, longe, algum irmão estava sofrendo uma tentação do Inimigo, e já meio vencido, soprava a buzina avisando a todos os ermitas para que o ajudassem com as suas orações a rechaçar Belzebu. Sentado no seu rochedo, Cristóvão olhava, cheio de simplicidade, sem compreender, com as mãos pousadas sobre os joelhos – quando de outro lado da serra, lá no cimo, outra buzina soou, chamando socorro para outra alma atacada. Mais tumultuosas se precipitaram as orações do ermitão. Mas a buzina ressoava mais aflita! E então o santo homem, desesperado, gritou a Cristóvão que acendesse uma fogueira perto da cruz, para que ela, destacando em negro sobre o vermelho do lume, fosse vista pelos demônios, que nessa noite pareciam dar um ataque terrível à santa montanha.

Ferindo lume com duas pedras, Cristóvão, rapidamente, fez uma fogueira, soprando com as faces inchadas: a lenha nova estalou, uma chama subiu, outros lumes em breve apareceram na negrura da serra: - e os sons das buzinas decresciam como as ânsias de um coração que sossega.