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Página:Ultimas Paginas (Eça de Queirós, 1912).djvu/465

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sabiás a gorjear Madame Angot, e vendedores de retalho citavam Augusto Comte... Para que prolongar o inventário doloroso? Bem cedo, do Brasil, do generoso e velho Brasil, nada restou: nem sequer brasileiros, porque só havia doutores – o que são entidades diferentes. A Nação inteira se doutorou. Do Norte ao Sul, no Brasil, não há, não encontrei senão doutores! Doutores, com toda a sorte de insígnias, em toda a sorte de funções! Doutores, com uma espada, comandando soldados; doutores, com uma carteira, fundando bancos; doutores, com uma sonda, capitaneando navios ; doutores, com um apito, dirigindo a polícia; doutores, com uma lira, soltando carmes; doutores, com um prumo, construindo edifícios; doutores, com balanças, misturando drogas; doutores, sem coisa alguma, governando o Estado! Todos doutores. O Dr. Tenente-Coronel... O Dr. Vice-almirante... O Dr. Chefe de Polícia... O Dr. Arquitecto... Homens inteligentes, instruídos, polidos, afáveis – mas todos doutores! E este título não é inofensivo: imprime carácter. Uma tão desproporcionada legião de doutores envolve todo o Brasil numa atmosfera de doutorice.

Ora o feitio especial da doutorice é desatender as realidades, tudo conceber a priori, e querer organizar e reger o mundo pelas regras dos compêndios. A sua expressão mais completa está nesse doutor, Ministro do Império,