igual talvez ao que este sentia por ele. Então nesse breve cambiar de vistas, como que essas duas almas mutuamente se falharam, exprimindo uma o pensamento apenas vago que na outra errava.
Entretanto o pobre negro, fiel ao humilde hábito do escravo, com os braços cruzados sobre o peito, descaía agora a vista para a terra, aguardando tímido uma nova interrogação.
Apesar da febre, que despontava, o cavaleiro começava a coordenar suas ideias, e as expressões do escravo, e os serviços que lhe prestara, tocaram-lhe o mais fundo do coração. É que em seu coração ardiam sentimentos tão nobres e generosos como os que animavam a alma do jovem negro: por isso, num transporte de íntima e generosa gratidão, o mancebo, arrancando a luva que lhe calçava a destra, estendeu a mão ao homem que o salvara. Mas este, confundido e perplexo, religiosamente ajoelhando, tomou respeitoso e reconhecido essa alva mão, que o mais elevado requinte de delicadeza lhe oferecia, e com humildade tocante extasiado beijou-a.
Esse beijo selou para sempre a mútua amizade que em seus peitos sentiam eles nascer e vigorar. As almas generosas são sempre irmãs.
— Não foste por ventura o meu salvador? – perguntou o cavaleiro com acento reconhecido, retirando dos lábios do negro a mão, e malgrado a visível turbação deste apertando-lhe com transporte a mão grosseira; mas onde descobria, com satisfação, lealdade e pureza.
— Meu amigo, – continuou – podes acreditar no meu reconhecimento e na minha amizade. Quem quer que sejas, eu a prometo: sou para ti um desconhecido;