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um bom copo lapidado a luzir-me alambreado com os doces e perfumados resplendores do old sack; em quanto o fogão e os ponderosos castiçaes de cobre brunido projectam no antigo tecto almofadado, nos pardos compartimentos de carvalho que forram o apposento, aquellas fortes sombras vacillantes de que as velhas fazem visões e almas-do-outro-mundo, de que os poetas — poetas como Shakspeare — fazem sombras de Banco, bruxas de Mackbeth, e até a rotunda pansa e o arrastante espadagão do meu particular amigo Sir John Falstaff, o inventor das legítimas consequencias, o fundador da grande eschola dos restauradores caturras, dos poltrões pugnazes que salvam a patria de parolla e que ninguem os atura em tendo as costas quentes.

Oh Falstaff, Falstaff! eu não sei se tu es maior homem que Sancho Pança. Creio que não. Mas maior pansa tens, mais capacidade na pansa tens. Quando nossos avós renegaram de San’ Thiago por castelhano perro, e invocaram a San’ Jorge, tu vieste, ó Falstaff, em sua comitiva de Inglaterra e aqui tomaste assento, aqui ficaste, e foste o patriarcha d’essa immensa progenie de Falstaffs que por ahi anda.