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Página:Vida e morte de M J Gonzaga de Sá (1919).djvu/205

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— Olha, que falo de amor! Hein?

— Compreendo.

— É preciso tê-lo... Tenho te dito sempre que os antigos afirmavam que Vênus é uma deusa vingativa... Não perdoa e tu sofrerás se não lhe prestares culto...

— Não há Vênus, retorqui.

— Quem sabe lá?

Trocávamos essas palavras nos últimos dias da sua existência, quando a alteração do seu gênio já se refletia claramente na saúde; e eu via bem que Gonzaga de Sá fanava-se, dissolvia-se vagarosamente ao fogo lento de suas secretas recordações e dos desgostos que o aparecimento delas lhe fizera assomar na alma. As faces se encovavam; os olhos, seus doces olhos, perdiam o brilho, apareciam mortiços e ganhavam uma estranha auréola. Não andava com a mesma firmeza, e o seu humor continuou a desequilibrar-se ainda mais. De uns tempos em diante, a sua palestra era frequentemente cortada por bruscas explosões de irritação, de queixumes indignos de sua altivez, em geral pueris e sem fundamento, passando espantosamente da mais intensa tristeza para a mais ruidosa alegria.

Aleixo Manuel, o afilhado, trouxe-lhe — quem sabe? — para a vida alguma coisa que