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Página:Vidas seccas.pdf/166

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Graciliano Ramos

um segundo, o policia estaria morto. Imaginou-o assim, cahido, as pernas abertas, os bugalhos apavorados, um fio de sangue empastando-lhe os cabellos, formando um riacho entre os seixos da vereda. Muito bem! Ia arrastal-o para dentro da catinga, entregal-o aos urubus. E não sentiria remorso. Dormiria com a mulher, socegado, na cama de varas. Depois gritaria aos meninos, que precisavam criação. Era um homem, evidentemente.

Aprumou-se, fixou os olhos nos olhos do policia, que se desviaram. Um homem. Besteira pensar que ia ficar murcho o resto da vida. Estava acabado? Não estava. Mas para que supprimir aquelle doente que bambeava e só queria ir para baixo? Inutilizar-se por causa duma fraqueza fardada que vadiava na feira e insultava os pobres! Não se inutilizava, não valia a pena inutilizar-se. Guardava a sua força.

Vacillou e coçou a testa. Havia muitos bichinhos assim ruins, havia um horror de bichinhos assim fracos e ruins.

Afastou-se, inquieto. Vendo-o acanalhado e ordeiro, o soldado ganhou coragem, avançou,