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Página:Vidas seccas.pdf/177

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Vidas Seccas
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— Miseraveis.

A colera delle se voltava de novo contra as aves. Tornou a sentar-se na ribanceira, atirou muitas vezes nos ramos do mulungu, o chão ficou todo coberto de cadaveres. Iam ser salgados, extendidos em cordas. Tencionou aproveital-os como alimento na viagem proxima. Devia gastar o resto do dinheiro em chumbo e polvora, passar um dia no bebedouro, depois largar-se pelo mundo. Seria necessario mudar-se? Apesar de saber perfeitamente que era necessario, agarrou-se a esperanças frageis. Talvez a secca não viesse, talvez chovesse. Aquelles malditos bichos é que lhe faziam medo. Procurou esquecel-os. Mas como poderia esquecel-os se estavam ali, voando-lhe em torno da cabeça, agitando-se na lama, empoleirados nos galhos, espalhados no chão, mortos? Se não fossem elles, a secca não existiria. Pelo menos não existiria naquelle momento: viria depois, seria mais curta. Assim, começava logo — e Fabiano sentia-a de longe. Sentia-a como se ella já tivesse chegado, experimentava adiantadamente a fome, a sede, as fadigas immensas das retiradas. Alguns dias