Pintura de uma dama namorada de um letrado
Quando agora mais amante
Vos vejo estar estudando
Cuidados da Deusa Astréia
Nos ócios do Deus vendado;
Pois amais um Serafim,
Donde achais como letrado,
Que se aclama Peregrino
Quanto sois Feliciano.
O cabelo, que por negro,
E por lustroso comparo,
É muito Nigro nas cores,
É muito Febo nos raios.
Traz nos olhos, e na testa
Alvoroto, pois alcanço
Que Alva se ostenta por branca,
Que o Roto tem por rasgados.
Com Júlio Claro parecem,
Se estão peitos abrasando;
Cada qual no ardor é Júlio,
Cada qual na luz é Claro.
Se o gracioso rosto advirto,
Se o belo nariz retrato,
É seu nariz Fermosino,
É seu rosto Graciano.
Na boquinha faladora,
Que mui rosada a declaro,
É nas vozes Parladoro,
É nas cores Rosentálio.
A Mascardo, e Lambertino
Na língua, e nos dentes acho;
É na língua Lambertino,
É nos seus dentes Mascardo.
Tomásio, e Nata pondero,
Se os peitos, e mãos comparo;
Nos peitos de leite a Nata,
Nas mãos de avara a Tomásio.
Leotardo o coração julgo
Com rigores igualados;
É nos rigores mui Leo,
É nos favores mui Tardo.
Espino, e Salgado, amigo,
Quero nela ponderar-vos;
É seu desdém todo Espino,
Todo seu dito é Salgado.
Enfim se quereis de Clóri
Os favores soberanos,
Dai-lhe lições de Moneta,
Tereis estudos de Amato.