Poesias (Bernardo Guimarães, 1865)/Evocações/Lembrar-me-hei de ti
Ahora e siempre.
Lembrar-me-hei de ti, e eternamente
Hei de chorar tua fatal ausencia,
Emquanto atroz saudade
Não extinguir-me a seiva da existencia;
E recordando amores que frui,
Por estes sitios sempre entre suspiros
Lembrar-me-hei de ti.
De noite no aposento solitario
Scismando a sós, verei a tua imagem
Apparecer-me pallida e saudosa
Dos sonhos na miragem;
E então chorando o anjo que perdi,
Meu leito banharei de ardente pranto
Chamando em vão por ti.
Quando a manhã formosa alvorecendo
De seus fulgores inundar o espaço,
Demandarei saudoso
Esse lugar em que no extremo abraço
Teu lindo corpo ao peito meu cingi;
E d’este valle os échos acordando
Perguntarei por ti.
Quando por trás d’aquelles arvoredos
O sol sumir-se, vagarei sozinho
Por essas sombras, onde outr’ora juntos
Nos sentámos á borda do caminho;
E ás auras que suspirão por alli,
Inda teu doce nome murmurando,
Hei de fallar de ti.
Além, onde sonora a fonte golpha
A’ sombra de um vergel sempre viçoso,
Que sobre nós mil flôres entornava,
Irei beijar a relva em que ditoso
Sobre teu seio a fronte adormeci,
E com a clara lympha que murmura,
Suspirarei por ti.
E quando emfim seccar-se a ultima lagrima
Nos olhos meus em triste desalento,
Bem como a lyra, em que gemendo estala
A extrema corda com dorido accento,
No sitio em que a primeira vez te vi,
Exhalando um suspiro, de saudades
Hei de morrer por ti.
Araxá, 1856