Poesias offerecidas ás senhoras Portuenses/Mote. Logo que eu nasci no mundo

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Mote.
 
Logo que eu nasci no mundo,
Nascemos quatro n'um dia,
Nasci eu, nasceu desgraça
Tristeza, melancolia.


Ah! Marilia! o teu rigor
Pelo fado é inspirado,
Que sempre tem conspirado
Contra mim com bem rancor:
Cada vez com mais furor.
Lá sáe d'esse averno fundo
Algum mau genio immundo,
Que sem me perder de vista,
Me assentou na sua lista,
Logo que eu nasci no mundo!

Deste modo não estranho
Minha nova desventura;
Vivo triste, em amargura,
Meu soffrimento é tamanho,
Que de pranto o rosto banho,

E prazer, doce alegria
De mim ha muito desvia
A minha sorte perversa,
E a outros ella é adversa,
Nascemos quatro n'um dia!

Um mau astro presidiu,
De certo ao meu nascimento,
Que sempre o negro tormento,
Desde o berço me seguiu !...
Té que a esp'rança me fugiu,
Sem ventura o tempo passa,
Qualquer mudança que faça
Só p'ra meu damno será !
Pois sempre me lembrará,
Nasci eu, nasceu desgraça!..

Já em nada prezo a vida,
Que não cessa o teu rigor,
Esqueceste o meu amor;
Porém ainda me és querida,
Sendo mesmo fementida !
Roubaste minha alegria,
E jámais espero um dia
Essas venturas fagueiras,
Pois são minhas companheiras,
Tristeza, melancolia !..