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Por vida do meu Gonçalo

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1Por vida do meu Gonçalo,
Custódia formosa, e linda,
que eu não vi Mulata ainda,
que me desse tanto abalo:
quando vos vejo, e vos falo,
tenho um pesar grande, e vasto
do impedimento, que arrasto,
porque pelos meus gostilhos
fora eu Pai dos vossos Filhos
antes que vosso Padrasto.

2O diabo sujo, e tosco
me tentou como idiota
a pecar com Maricota,
para não pecar convosco:
mas eu sou homem tão osco,
que a ter notícia por fama,
que lhe mamastes a mama,
e eu tinha tão linda Nora,
então minha sogra, fora,
e não fora minha Dama.

3Estou para me enforcar,
Custódia, desesperado,
e o não tenho executado,
porque isso é morrer no ar:
quem tanto vos chega amar,
que quer por mais estranheza
obrar a maior fineza
de morrer, porque a confirme,
morra-se na terra firme,
se quer morrer com firmeza.

4Já estou disposto d'agora
a meter-vos num batel,
e dar convosco em Argel
por casar com minha Nora:
não vos espante, Senhora,
que me vença tal furor,
que eu sei, que em todo o rigor
o mesmo será, e mais é
ir ser cativo em Salé,
que ser cativo do Amor.