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Pule do avião, Tio Zaca!

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Ele jamais se elegeu: o poder era proibido aos caboclos “ignorantes”

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Há uma década morria o mais querido cascavelense de todos os tempos, uma espécie de “Lula” municipal, Zacarias Silvério de Oliveira, o Tio Zaca. Ele era amado pelo povo, hostilizado pelas elites e nunca lhe foi permitido se eleger vereador, prefeito ou deputado. Mas Tio |Zaca deixou uma herança de trabalho e profunda preocupação com o desenvolvimento de sua comunidade e de seu povo.

Depois de concorrer sistematicamente a todos os cargos em disputa eleitoral em Cascavel, nas décadas de 60 e 70, repentinamente ele se afastou da política e não quis mais concorrer a cargo algum. Por que? Simplesmente porque tentaram matá-lo numa trama cinematográfica e por um triz o grupo que pretendia se livrar dele não conseguiu. O preço da sobrevivência foi abandonar a política e não atrapalhar mais os planos de um grupo que desejava comandar a cidade.

Um dos dez filhos de Tio Zaca, Adir Pedro Silvério sofria de um problema ortopédico – “tinha os pés tortos” – e o tratamento necessário precisava ser feito em Curitiba. Um avião cedido pelo ex-governador Paulo Pimentel transportava Adir todos os fins de semana à capital para seguir o tratamento. Os adversários de Tio Zaca decidiram se aproveitar disso para lhe armar uma engenhosa arapuca.

“Houve um telefonema dizendo que era para o pai comparecer em Curitiba que o Paulo Pimentel gostaria de falar com ele”, narra Adir. “E quando estava a caminho, já em pleno vôo, as pessoas que estavam no avião então mandaram papai pular”. Seria um salto para a morte, mas Tio Zaca estava prevenido. Poucos dias antes, Tio Zaca acidentalmente atropelou um rapaz na frente do cinema (hoje a Caixa Econômica do Calçadão), e passou a sofrer ameaças de vingança. O delegado o aconselhou a andar armado, como era habitual entre os cascavelenses naquela época.

Dentro daquele avião, Tio Zaca estava diante de um desafio de vida ou morte. “Como a situação não estava das melhores e ele tinha aceito o conselho do delegado, justamente naquele dia ele estava armado e reagiu”, relembra Adir. Tio Zaca decidiu então usar a arma e recorrer a uma ameaça definitiva: “Se eu pular, todos daqui também terão que pular!” “Então pousaram o avião e papai deixou essa história quieta. Mas a partir daí ele nunca mais quis se envolver com política”, salienta Adir. Essa, portanto foi a causa pela qual Tio Zaca, depois de haver quase chegado à Prefeitura e à Assembléia Legislativa, decidiu interromper sua carreira política.

Zacarias Silvério de Oliveira era sobrinho do fundador da cidade de Cascavel, José Silvério de Oliveira, o Tio Jeca. Nasceu em Guarapuava, a 15 de março de 1924, filho de Ladislau Roza Silvério e Maria Francisca Silvério. Veio para a região na década de 30, acompanhando o tio e o pai, que já tinham negócios na região de Cascavel desde 1922 (Tio Jeca havia arrendado a região da Encruzilhada para a produção de milho e criação de suínos).

Tio Zaca tentou se eleger vereador em 1960, aos 36 anos, e mesmo sendo mais votado que vários medalhões da política local – Sandálio dos Santos, Valdir Farina, Nelson Cunha e Adelar Bertolucci –, ficou em quarto lugar na lista de seu partido, o PSP, que então elegeu Algacyr Biazetto. Em 1964 tentou a Prefeitura, batendo de frente com as grandes lideranças emergentes da cidade, especialmente Odilon Reinhardt (PTB), sendo liquidado nas urnas com seu inexpressivo PRP. Nesse pleito o PRP era tão fraco e desarticulado que a chapa concorrente à Câmara Municipal obteve apenas 271 votos, menos da metade do número necessário para eleger um vereador.

E o Fórum pega fogo

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Mas em 1968 a situação seria diferente. Tio Zaca era aclamando como prefeito por todos os lugares que visitava em campanha eleitoral. A ditadura era detestada pela população e o MDB, frente política antiditatorial, começava a receber uma adesão arrasadora. Candidato pelo MDB, Tio Zaca nadava de braçada rumo à Prefeitura. Então, poucos dias antes da eleição, o Fórum Eleitoral pegou fogo (ou foi incendiado) e todos os registros de eleitores foram destruídos. Muitos eleitores do interior não conseguiram se cadastrar em tempo e a base eleitoral de Tio Zaca se viu repentinamente reduzida. Ao mesmo tempo, seus adversários eleitorais propagavam que como Tio Zaca estava sem eleitores, o “voto útil” seria em Octacílio Mion, experiente e bem-sucedido ex-prefeito, mesmo porque Tio Zaca era ignorante e despreparado, e seria um desastre na Prefeitura, sobretudo porque Cascavel precisava de um prefeito experiente, moderno e com trânsito em Curitiba.

Nem todos caíram nessa propaganda e Tio Zaca (MDB) obteve impressionantes 3.598 votos, apesar da destruição dos títulos eleitorais. Mas essa votação não foi suficiente para derrotar Mion (Arena), que recebeu 3.787 votos. Na época o sistema eleitoral era outro. Havia dois partidos – Arena e MDB – e três minipartidos no interior de cada um deles, as sublegendas. Por isso, podiam concorrer até seis candidatos – três em cada partido. O MDB concorreu com Tio Zaca, Gilberto Mayer e Valdemar Bobato, tendo o partido somado 6.970 votos.

A Arena concorreu com Mion, Paulo Marques e João Batista Cobbe, somando 7.296 votos. Ou seja, ao contrário da lenda que correu sobre Tio Zaca ter vencido a eleição e ter o mandato “roubado”, a única dúvida é se a destruição do Fórum impediu muitos eleitores de Tio Zaca de ir às urnas por falta de título. Seriam necessários, nesse caso, mais 327 eleitores para virar o jogo. Não eram muitos, já na ocasião. A história, portanto, poderia ter sido outra se o Fórum não fosse queimado.

De qualquer forma, Tio Zaca acabara de provar que era um grande eleitor. Com o aumento da população e uma campanha competente de qualificação eleitoral, Tio Zaca parecia imbatível para a próxima eleição à Assembléia Legislativa. Mas sempre foi boicotado e trapaceado em todas as eleições seguintes, até se afastar da política cedendo a ameaças de morte. A pedido do candidato Jacy Miguel Scanagatta, em 1976, concorreu sem entusiasmo à Câmara Municipal, apenas para reforçar a chapa da Arena.

A estratégia deu certo: a Arena detonou o MDB, elegendo 9 vereadores contra apenas 6. Tio Zaca ao se retirar da política deixou como herdeiro o advogado Fidelcino Tolentino, que realizou tudo aquilo que Tio Zaca não pôde e sempre quis ser: foi vereador, deputado estadual e prefeito. Tio Zaca morreu em 10 de janeiro de 1996, sob o reconhecimento de Tolentino e Mário Pereira de que, embora tenha virado a casaca ao se bandear para a Arena, foi de fato, no plano municipal, o iniciador da virada contra a ditadura.

(Fonte: Alceu A. Sperança, jornal O Paraná, janeiro de 2006)

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