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LXXXI

Deseja vê-lo o forte lusitano,
Por que interprete a língua que entendia,
E toma por mercê do céu sob'rano
Ter como enteada o idioma da Bahia.
Mas, quando esse prodígio avista humano,
Contempla no semblante a louçania,
Pára um, vendo o outro, mudo e quedo,
Qual junto de um penedo outro penedo.

LXXXII

Só tu, tutelar anjo, que o acompanhas,
Sabes quando a virtude ali se arrisca
E as fúrias da paixão, que acende estranhas,
Essa de insano amor doce faísca
Ânsias no coração sentiu tamanhas
(Ânsias que nem na morte o tempo risca),
Que houvera de perder-se naquel’hora,
Se não fora cristão, se herói não fora.

LXXXIII

Mas desde o céu a santa inteligência
Com doce inspiração mitiga a chama,
Onde a amante paixão ceda à prudência
E a razão pode mais que a ardente flama.
Em Deus, na natureza e na consciência
Conhece que quer mal quem assim ama,
E que fora sacrílego episódio
Chamar à culpa amor, não chamar-lhe ódio.