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DOM PEDRO E DOM MIGUEL

Era por taes meios, no dizer dos criticos da regencia, que a infanta merecera as sympathias dos ultra-liberaes e se tornara sua escolhida. Estaria ella porem de connivencia com elles? A' Court responde que «se bem não esteja de modo algum provados seu accordo com os enthusiastas da sua elevação ao throno e sua approvação d'este plano, difficil é de acreditar que o desconhecesse »[1]. O embaixador de resto envolveu-se no assumpto, ao que affirma para extirpar o mal. Decidiu Porto Santo a não abandonar suas funcções e auctorizou-o a communicar officiosamente (provately) ao conselho de regencia, em presença da infanta, que o governo britannico tivera conhecimento d'esses planos secretos, e mesmo do despacho para o Rio de Janeiro do emissario incumbido de intrigar Dom Miguel junto a Dom Pedro; mas que esperava que a regencia tomaria as providencias necessarias para impedir taes projectos de adquirirem consistencia[2].

Immediatamente depois[3] o diplomata inglez procurou desculpar a infanta innocentando-a mesmo de cumplicidade passiva: sua unica culpa teria sido não haver repellido com sufficiente indignação as allusões destacadas (loose hints) occasionalmente enunciadas pelos aduladores que a cercavam sobre a possibilidade de se produzirem circumstancias que teriam eventualmente trazido a corôa a pousar-se sobre a sua fronte. Teria pois havido exagero nos boatos, consequencia dos tempos turvos e das insidias que de todos os lados brotavam. O que se pode aventar sem recear desmentido e sem formular juizo temerario é que não teria desagradado á infanta ver realçada sua dignidade, o que é aliás naturalissimo, tanto mais quanto as cousas não podiam ficar assim. Nas palavras de Sir William A' Court[4], «será summamente difficil, quando não impossivel, conservar por mais tempo o infante Dom Miguel na inacção e exclusão a que se acha presentemente condemnado; mas a sua volta e a elevação ao poder que d'ahi resultará, na qualidade de regente ou na de Rei, não deixariam de ser acompanhadas de perigos ».

O embaixador de Inglaterra não era, como se lhe exprobrou em vida e como ficou a lenda, um franco partidario de Dom Miguel. Encarava a situação com bastante imparcialidade, moderação e bom senso, servindo do melhor modo possivel a

  1. «Tough it is by no means proved that she has given into the project it is difficult to believe that she can have been wholly unacquainted with it».
  2. Despacho citado de 27 de Maio de 1826.
  3. Despacho secreto e confidencial de 2 de Junho de 1826.
  4. Despacho citado de 2 de Junho de 1926.