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HISTORIAS E SONHOS

tasia que os Silvas davam. As senhoras retiraram-se e só ficaram, na sala, os homens, bebendo Wisky. André, impaciente e desattento; o velho lente, indifferente e compassivo, contando historias brejeiras, com vagar e cuidado; o filho, sempre a procurar caminho para exhibir o seu saber em cousas carnavalescas. A conversa ia cahindo, quando o velho disse para o deputado:

— Já ouviu a «Bamboula» de Gottschalk, doutor?

— Não... Não conheço...

— Vou tocal-a.

Sentou-se ao piano, abriu o album onde estava a peça e começou a executar aquelles compassos de uma musica negra de Nova-Orleans que o famoso pianista tinha filtrado e civilisado.

A filha entrou, linda, fresca, veludosa, de panno da Costa ao hombro, trunfa, com o collo inteiramente nú, muito cheio e marmoreo, separado do pescoço modelado, por um collar de falsas turquezas. Os braceletes e as missangas tilintavam no peito e nos braços, a bem dizer totalmente despidos; e os bicos de crivo da camisa de linho rendavam as raizes dos seios duros que mal supportavam a alvissima prisão onde estavam retidos.

Ainda poude requebrar, aos ultimos compassos da «Bamboula», sobre as chinellas que occupavam a metade dos pés; e toda risonha sentou-se por fim, esperando que aquelle Salomão de pince-nez de ouro lhe dissesse ao ouvido:

«Os teus labios são como uma fita de escarlate; e o teu fallar é doce. Assim como é o vermelho da romã partida, assim é o nacar das tuas faces; sem fallar no que está escondido dentro».

O doutor Maximiliano deixou o tamborete do piano e o deputado, bem perto de Clodia, se não fallava como o rei Salomão á rainha de Sabá, dilatava as narinas para sorver toda a exhalação acre daquella moça, que mais capitosa se fazia dentro daquelle vestuario de escrava desprezada.

A sala encheu-se de outros convidados e a sessão de musica veiu a cair na canção e na modinha. Fred cantou e