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os selvagens do Brasil
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zendo que elle ia morrer. De manhã cedo veio procurar-me e contou o caso. Expliquei-lhe que nada lhe succederia se desistisse de me comer e desaconselhasse aos demais de o fazerem. Guaratiga-açú accordou nisto, declarando que se os meus apresadores me não matassem não me faria elle nenhum mal, e que em qualquer caso não comeria da minha carne.

Do mesmo modo sonhou commigo um terceiro morubichaba de outra cabana, Karimã-kui (farinha de carimã). Chamou-me á sua choça, deu-me de comer e queixou-se de que numa expedição guerreira havia capturado e morto um portuguez, do qual comera tanto que o peito ainda lhe doia disso; e, pois, resolvera desd'ahi não mais devorar ninguem. Sonhara commigo sonhos horriveis que lhe prediziam a morte.

Consolei-o, como o fizera ao outro, affirmando que não correria perigo nenhum caso disistisse de comer gente.

Tambem as megeras de todas as cabanas, as quaes tanto me haviam maltratado com beliscões, pancadas e ameaças, começaram a dizer-me:

Chê-raiva (meu filho), não nos deixe morrer. Se te tratámos mal é que te julgavamos portuguez, aos quaes detestamos. Já comemos varios