Qualquer serve
Aconteceu isto em Pernambuco. Não sei mesmo em que cidade, mas foi nas proximidades do Recife.
Havia lá uma família muito rica, cujo chefe era o Barão de ***.
Tinha este muitas filhas e nenhum varão; e todos os bacharéis da redondeza cercavam as meninas de todas as homenagens.
Era o barão uma espécie Zé Bezerra, porquanto, sendo dono de uma grande usina de açúcar, dominava uma grande superfície ao derredor dela, marcando preços e emprestando dinheiro a bons juros sobre as futuras safras dos canaviais.
Com uma fortuna imensa, ele afugentava os prováveis maridos de suas filhas que temiam fazer-lhe o sacramental pedido.
Um belo dia, porém, houve um mais ousado que se animou a faze-lo.
Foi o doutor X, promotor da localidade, formado recentemente e capaz de tudo.
O bacharelete vestiu-se com o melhor terno que tinha e foi até ao engenho do Barão de ***.
O barão, conquanto fosse muito orgulhoso de seu título e da sua fortuna, era delicado e atencioso.
Ouviu com toda a polidez a exposição do bacharel.
Dizia este:
— Animei-me a fazer-lhe este pedido, porquanto a minha situação social e a minha idade parecem mo permitir. O senhor barão, qualquer que seja a sua opinião, não se ofenderá com ele. Não é assim?
— Não há dúvida. Mas com qual das minhas filhas o senhor deseja casar-se?
— Com da . Irene.
O barão coçou as barbas e disse, após um instante:
— Não lhe posso conceder a mão de minha filha Irene.
— Porque, barão?
— Ela já é noiva do doutor Castrioto, deputado estadual.
O promotor pensou alguns minutos; o barão ficou suspenso, à espera da resposta do rapaz, até que este disse:
— Não faz mal. Caso-me com a outra.
— Qual?
— A segunda.
— A Inês?
— Sim. A Inês.
Careta, Rio, 27-12-1919.