Revista Luso-Brasileira/1860/2/Lembranças de minha mãi

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Minha mai morreu tão cedo!...

Eu era pequeno , era feliz ; porque não conhecia os enganos do mundo , e os pesares da vida ; innocente corria por entre as campinas, colhia flores e ia derramal-as sobre minha mai, sallava os regalos que encontrava no meu brincar, corria atraz da borboleta azul, travava com ella um combate que acabava pela minha victoria ; adormecia socegado e feliz no meu berço innocente, embalado pelas cantigas e pelos beijos maternos que nas faces recebia ; eu dormia o somno da infancia era feliz:oh!quem me dera sempre viver assim! Ao depois cresci, quando podia retribui-lhe as suas caricias ; quando mais me era precisa a sua existencia, a cruel sorte m'a roubou; oh! quanto soffro hoje que isolado do mundo, cançado da vida, não encontro o seu sio para esconder as minhas lagrimas, e nem os seus himnos para adoçar-me as dores.

...... Uma mãi!... Palavra sublime, que enche o coração de prazer e enthusiasmo, que eleva a alma a um viver innocente e bello.

Uma mãi !!... Unico ente que nos ama no mundo, que comprehende as nossas dòres, que soffre quando soffremos, que chora quando nossa alma é triste, que se desespera quando choramos, e que morre quando o homem deixa o mundo de illusões e prazeres para ir viver no mundo das felicidades.—Dòres reaes; soffrer sincero.

Oh! como é triste existir sem ter o elo que nos prende á vida, sem os affagos do verdadeiro amor, sem as docuras da verdadeira affeição. E haverá quem não chore uma mãi ?

Quem não sinta um vacuo no coração quando uma lagrima se deslisa sobre o tumulo de uma mãi! Quem não soffra muito sem os cuidados desse anjo que o Senhor enviou á terra para ensinar-nos o amor, o dever e a religião ?

Oh! eu sou infeliz, muito infeliz.....

Aos 9 annos perdi minha mãi, fiquei só no mundo; só como a rôla sem o ninho! Entrei no mundo das illusões e dos enganos; soffri muito, descri muito. A sociedade egoista e corrupta fez-me descrer de todas as felicidades, de todo o amor sincero e verdadeiro, de toda a virtude; porque já tinha perdido o unico ente que me amava com amor sincero, e a crença que me fazia feliz: fugi do mundo, entreguei-me á solidão e muito chorei, porque não encontrei quem me acalentasse nos braços e mitigasse as minhas dores.—Não tinha mai !

Como eu soffro !...minha mai, lá da mansão dos justos, lança a benção sobre teu filho, pede a Deus pela felicidade do padecente . Eu sem ti, sem o perfume da flor que me fazia feliz e crente, chorarei sempre sem consolação; porque uma mãi perde-se uma vez e nunca mais se encontra.