Senhora Cota Vieira

Wikisource, a biblioteca livre

Senhora Cota Vieira,
Deus me não salve a minha alma,
se vós não me pareceis
uma linda, e gentil dama.
Tão risonha como a Aurora,
tão alegre como a Páscoa,
mais belicosa, que o fogo,
e mais corrente, que a água.
Picará como nascida
na picardia da França,
e assim francesa nas obras,
Portuguesa nas palavras.
Tudo chamais por seu nome
tão propriamente, tão clara,
que ao cono lhe chamais cono,
chamais caralho à caralha.
Malditas da maldição
de Deus sejam as tavascas,
que de surradas nas obras
põem de bioco as palavras.
Há cousa como chamar,
o que uma cousa se chama,
porque sirva de sustento
à luxúria, que desmaia.
Há cousa como falar,
como o Pai Adão falava,
pão por pão, vinho por vinho,
e caralho por caralha.
Quem pôs o nome de crica
à crica, que se esparralha,
senão nosso Pai Adão
quando com Eva brincava?
Pois se pôs o nome às cousas
o Pai da nossa prosápia,
porque Deus lho permitiu,
nós por que hemos de emendá-las?
Mas tornando ao vosso garbo,
sois, Maricas, tão bizarra, que
estive nem mais nem menos
por vos dar a piçalhada.
Tive debaixo da língua
o pedir-vos uma lasca
da nata do vosso cono,
se é, que tem côdea essa nata.
Quando a culatra vos vi
tão tremenda, e rebolada,
meti logo a mão à porra,
e estive saca, não saca.
Mas reverente adverti,
que ali o Capitão estava
senhor das minhas ações
e dono da vossa casa.
Porque inda que sempre diz,
que assentou convosco a espada,
eu creio, no que Deus disse,
não no que um berrante fala.
Quem, o que deve a um amigo
em respeitos lhe não paga,
não é amigo, nem homem,
é uma besta assalvajada.
Mas andar, foda ele embora,
isso não importa nada,
teremos amores secos,
seco é o biscouto, e campa.
Falaremos sempre aos molhos,
e riremos às canadas,
folgaremos, que amor seco
sem molhar beiço se passa.
Irei conversar convosco,
e a reverenda Madrasta
entre os pontinhos que der
meta sua colherada.
Assim se passa uma vida
tão santa, e tão ajustada,
que ganharemos o céu
na sacra via às braçadas.
Meus recados à Velhinha,
outros tantos à Mulata,
à Negrinha da corrente
e às vossas Damas pintadas.