Sonetos do Exilio/3
III
A’ Imperatriz
Não ha quem não tenha lido nos Vultos e Factos do Sr. Dr. Affonso Celso as paginas maviosas em que se descrevem as angustias do Imperador, quando no Porto lhe morreu a sancta esposa, tão justamente cognominada Mãe dos Brasileiros. Echo desta immensa dôr é o presente
soneto, repassado do mais fundo sentimento e,
por assim dizer, escripto com as lagrymas que
o venerando banido sabia occultar com imperturbavel compostura.
Relembra o 4.º verso amantissima expressão de Horacio, applicada a Virgilio: Anima dimidium mece (Odarum, L. I, 3.)
O original foi lançado, com lapis e em lettra quasi inintelligivel, á margem de um jornal portuense, onde se leem pormenores do funeral.
III
A’ Imperatriz.
Corda que estala em harpa mal tangida,
Assim te vais, ó doce companheira
Da fortuna e do exilio, verdadeira
Metade de minha alma entristecida !
De augusto e velho tronco hastea partida
E transplantada á terra Brasileira,
Lá te fizeste a sombra hospitaleira.
Em que todo infortunio achou guarida.
Feriu-te a ingratidão no seu delirio;
Cahiste, e eu fico a sós, neste abandono,
Do teu sepulchro vacillante cyrio!
Como foste feliz! dorme o teu somno...
Mãe do povo, acabou-se-te o martyrio;
Filha de reis, ganhaste um grande throno!