Suspiros poéticos e saudades (1865)/Os Suspiros da Patria
Donde vêm estes suspiros?
Donde vêm tão magoados?
Que a mim chegam tão quebrados!
Que peito os pôde conter?
Que distância eles venceram?
Que longos mares passaram?
Que ventos atravessaram,
Para aqui virem morrer?
Estes tão tristes suspiros
Aqui não foram nascidos;
Não; suspiros tão doídos
Quem podia aqui gerar?
Só uma mãe malfadada,
Que vê seus filhos lutando,
Nos céus os olhos fitando,
Assim pode suspirar.
Numa praia solitária
Bate a vaga moribunda
Menos triste e gemebunda,
Pejando o ar de seus ais.
Vós, gemidos dos desertos,
Entre as folhas vagueando,
Nas cavernas ululando,
Tanto horror vós não causais.
Suspiros, donde vindes? — Mal vos ouço,
Em meu peito murmura o eco vosso
Surdo, funéreo, como a voz que soa
Longe no ermo, da enchente que se arroja
De alpestre rocha, em borbotões fervendo,
E se esconde da terra nas entranhas;
E minha alma estremece apavorada,
Como de uma harpa a corda magoada.
Suspiros, donde vindes? — Sois da Pátria?
Ah! sois da Pátria... Sim, eu vos conheço
Por esse acento de aflição, de angústia,
Por esta dor, que me causais, tão agra.
Tu suspiras, oh Pátria!
Co'os teus os meus suspiros se misturam.
E que al fazer eu posso?
Se é surda a Providência às preces tuas,
Que pode a frágil mão de um filho inútil?
Os teus suspiros
A mim chegaram,
E me abalaram
O coração.
Socorro dar-te
Embalde intento,
E só aumento
Minha aflição.
Qual naufragante
Que uma onda impele,
Outra o expele
Ao alto-mar;
E de onda em onda
Sendo rolado
Já lacerado,
Vai encalhar.
Mas na praia não achando
Um asilo protetor,
O alento último exala,
E a alma envia ao Criador.
Assim morreis, suspiros, em minha alma,
Depois de haver o Oceano magoado.
Mas, oh Pátria, quem causa mágoas tuas?
Ah! não fales, não digas... sofre... espera.
Eu conheço teu mal. Ah! não são estes,
Qu'inda os pulsos têm lívidos dos ferros,
Recém-livres, costumes têm de escravos,
Estes não são, que ao teu porvir brilhante
As portas abrirão; são os seus filhos.
Espera, espera, que o porvir é grande;
E a vontade do Eterno, que os teus montes,
O teu céu, os teus rios nos revelam,
Será cumprida um dia: espera, espera.
Ainda ontem te ergueste de teu berço;
Mal um passo ensaiaste,
E não é crível que amanhã já morras.
Como em torno do sol os astros giram
Em círculo perpétuo,
Em torno do seu Deus as Nações marcham,
E de tal Astro à luz jamais se eclipsam;
Crê em Deus; que ele só salvar-te pode.
E vós, que a fronte ergueis de nós à cima,
Vós, que empunhais da governança o leme,
Vós, que velar deveis, até quando
Fareis da Pátria o patrimônio vosso,
E tolhereis seus passos?
Corai, corai de pejo, envergonhai-vos
De encher o excelso assento de poeira,
De poeira que sois, que um leve sopro
Dispersa, e acaba, e nem vestígios deixa
Para o crástino dia.
Nulidades, que humanas formas cobrem,
Empolas, que se geram num minuto,
E que noutro minuto se desfazem,
Como bolhas de espuma, que brincando,
De tênue tubo o infante cair deixa,
E no meio da queda desaparecem;
Que fizestes, que em vossa glória fale?
Nada!... Passastes como secas folhas,
Que os ventos remoinham.
Basta, enfim basta de ilusão, de engano.
Mira a Pátria a grandeza;
Vós a empeceis; deixai o campo livre
À Juventude, do progresso amiga.
Eu vos saúdo, Geração futura!
Só em vós eu confio.
Crescei, mimosa planta,
Sobre a terra da Pátria só regada
Com lágrimas e sangue.
Crescei, crescei da liberdade, oh filhos,
Para a Pátria salvar, que vos aguarda.