Tipos burlescos desenhados por Bruno Seabra/Introdução

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Ao bacharel Duarte P. Schetel

Introdução
(no dia dos meus anos)
Folguemos coração! Ainda agora
Comecei a ser gente na existência!
Vinte e dois anos só! Sou mesmo um noviço,
Um jacinto de amor na adolescência!

O buço desabrocha levemente,
Que macio que vem, quão será lindo?!
Ave! ireis da minha mocidade! —
Sê benvindo, meu buço, sê benvindo!
Mas... que é isto? Parece que entristeço?!
Eh-lá, tristeza — eh-lá! eu te esconjuro!
No dia dos meus anos... que lembrança!
De que me lembrei eu? Do meu futuro!

Do meu futuro...
..
José, traz-me um cigarro,
E de passagem o cognac e vinho.
....................................................
Vai ali perguntar, se é grega ou china
A palavra — futuro, — ao meu vizinho.
...................................................
É coisa, que há de vir?!...
Eu seja frade,
Se em coisas que hão de vir tenho esperanças!
Nasci... hei de viver!... sou fatalista,
Não creio em contos de ninar crianças!

Meu futuro é dormir sonos de fadas
Sobre a grama dos prados e boninas, —
Andar aí com fome pelas ruas
Mendigando os amores das meninas! —

Amor... falo em amor?...
Lembro-me agora,
Eu já tive uns amores; — há dois anos,
Amei uma donzela... inocentinha...
Ela amava, comigo, a três maganos!

Dois rivais para um? Não fui covarde,
Tive juízo, abandonei a praça:
Vim para casa, fiz uns versos tristes,
E d’aí... fui poeta... que desgraça.

Não... não quero na terra os meus amores,
Os duelos às vezes fazem danos...
É tão bom se viver... os dias passam...
No fim de doze meses se faz anos!...

Os amores de céu têm mais poesia,
Ali pode-se amar a rédeas soltas;
Lá no céu não há línguas de intrigantes,
Como as línguas daqui... tão desenvoltas.

A lua é uma cigana, arranja a vida
Com tetéias de amor, se não me engano,
Vale a pena pedí-la em casamento,
Tenho uns modos assim... para cigano!

Fumo cigarros, sei tocar viola,
Canto modinhas, com requebro e graça,
Para ser um cigano de mancheia
Só me falta vender rimas na praça.

Palavra de honra, (que no céu. Deus haja)
Sinto dentro do crânio uma fragura!
Ora, se a lua é fria como dizem,
No colo da cigana... que frescura?!

Ó lá de cima se te apraz um noivo,
Um pobre doidivanas cá debaixo,
Eu me apresento candidato a esposo,
E no leito de amor o nome encaixo!

Sou moço e pobre, — ouço missa às vezes:
Chamo a tod’os ministros de tiranos!...
Detesto o servilismo... (c’est dommage!)
E fiz hoje afinal — vinte e dois anos.

Se não recusas a proposta minha,
Dize ao nédio Mafona e sempre ledo,
Que se lembre da gente cá de baixo,
Do seu mundo, — que vai que mete medo!

Faz-me o favor levar-lhe estes folhetos,
Dize ao profeta-maganão que os leia;
E verá como a terra em sua ausência
É mesmo um ostrum mulundum candeia*.

  • Frase plebéia em Maranhão; belo, está bonito, não se tem o que dizer. É um primor etc