Versos da mocidade (Vicente de Carvalho, 1912)/Ardentias/Spleen

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SPLEEN

Fóra, na vasta noute, um vento de procela
Erra, aos saltos, uivando, em rajadas e em furia;
E num rumor de chôro, uma voz de lamuria,
Ouço a chuva a escorrer nos vidros da janela.

No desconforto do meu quarto de estudante,
Velo. Sinto-me como insulado da vida.
Eu imagino a morte assim, aborrecida
Solidão numa sombra infinita e constante...

Tu, que és forte, rebrame em furia, natureza!
Eu, caído num fundo abismo de tristeza,
Invejo-te a espansão livre do temporal;

E, no tedio feroz que me assalta e me toma,
Sinto anciarem-me n’alma instintos de chacal...
E compreendo Nero incendiando Roma.