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A esperança
163

 

«Nem siquer adeus disseste
«Á mãe que pedia o pão...
«Ai! meu filho que dôr esta!
«Terás por campa o meu collo ...
«Mas poderá ter consolo
«Quem chama seu filho em vão?....

«Morrer de fome o meu filho
«Emquanto que eu esmolava
«O pão, que sempre lhe dava,
«Que elle comia a sorrir!!..
«Ohl meu Deus! porque não levas
«A mãe qne seu filho perde?!..
«Da choupana a hera verde
«Parece com dôr cair!..

Faz uma cova na terra
A terna mãe desvairada.
Atira p'r'o lado a enxada
Aborta a campa já tem.
E quando a loira criança
Vai a poisar entre as flôres,
Não resiste a tantas dôres,
Sobre o filho cae tambem...

Alberto Pimentel.

 

 

Maria Isabel


Romance original por Maria Peregrina de Sousa

Dedicado á memoria de minha irmã

(De pag. 157)

XX

Os Libertadores

Estava a filha da infeliz D. Maria Carlota triste e pensativa no lindo quarto que lhe deram, e que Ermelinda não consentiu trocasse por outro mais modesto e sjmples. As continuas visitas d'Amaral, suas vistas e fallas amorosas, e mais que tudo as reflexões vagas mas venenosas de Ermelinda lhe suscitaram suspeitas. Debalde a sua inexperiente bondade e singeleza rebatia a desconfiança; o instincto a avisava que se machinava alguma coisa contra a sua honra.

― Estou louca! ― pensava ella agitada e procurando socegar ― Como ouso suspeitar infamias da generosa parenta que me tem em sua casa, como filha mimosa?! Tem idéas um tanto grosseiras, mas o coração é bom e a alma magnanima.

Ouviu de repente barulho na escada e a voz d'um homem que gritava:

― É o que lhe digo, hei-de fallar com a menina que aqui está. Espera-a á porta uma senhora, que a ha-de levar d'aqui.

― Parece-me a voz de Francisco! - disse ella comsigo, e pressurosa ia certificar-se, mas Ermelinda entrou arrebatada, impediu-a de sahir e fechou a porta por dentro dizendo:

― Está ali um doido!.. um doido furioso! Se elle nos agarra, espatifa-nos! Esteja muito caladinha...

E a levou para o fim do quarto quasi à força.

― Pareceu-me a voz do filho da snr.ª Carolina...

― É um doido, minha filha, um doido que faz medo. Não falle. Eu vou fazer bulha para o assustar.

E começou arrastando as cadeiras e fazendo grande ruido. Não ohstante isto Maria Isabel ouvia que altercavam na escada e percebeu distinctamente estas palavras que o marujo dizia com toda a força dos seus pulmões:

― Sr.ª D. Mariquinhas, fuja d'estes cachopos do demo. Está lá em baixo a sr.ª mãe e outra senhora que a vem buscar.

A donzella precipitou-se para a porta. Ermelinda largou a cadeira que arrastava e agarrou-a pela cinta fazendo-a recuar. Não lhe restava já senão a força para detel-a. Maria Isabel gritou com todas as suas forças:

― Acuda-me, sr. Francisco, acuda-me. Estou fecha...

Não pôde acabar. A mão d'Ermelinda lhe tapou a bocca, ao mesmo tempo que ella a arrastava comsigo, cercando-a com o outro braço.

Francisco ouvira bastante. Até alli o detivera Miquelina dizendo-lhe colerica que não vivia alli senão uma senhora com sua filha, e que elle pagaria cáro o insulto que fazia a suas amas; porém quando elle ouviu os gritos de soccorro da filha de Ricardo d'Oliveira, deu um encontrão furioso á rapariga e quiz subir. Mi-