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MONTEIRO LOBATO
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Dona Benta abriu ainda mais a bocca. Não podia comprehender aquillo. Havia muito tempo que não punha aquella saia; como pois os oculos tinham ido parar lá, e logo no bolso? Mysterio...

— Agora passe-me para cá os tres mil réis em notas novas. Promessa é divida, como diz tia Nastacia.

Dona Benta não teve remedio. Foi ao bahu, escolheu tres notas novas e deu-as á boneca. Emilia dobrou-as, bem dobradinhas, e foi correndo procurar o menino que já havia voltado da floresta.

— Prompto, aqui está o dinheiro, disse ella. Mas como você só precisa de 2$900, passe-me um tostão de troco.

Pedrinho arregalou os olhos, assombrado, e apalpou as notas para ver se eram verdadeiras. Depois tirou um tostão do bolso e deu-o á boneca.

— Não acceito tostão velho e feio, disse Emilia torcendo o nariz. Quero um novo, allumiando.

Pedrinho teve de procurar pela casa inteira o tostão mais novo que havia e teve tambem de concertar uma das rodas do carro de carretel, que estava solta. Só depois disso é que Emilia entregou o dinheiro.

— Para que quer tostão, Emilia? Dinheiro de nada vale para quem é boneca.

— Quero para rodar, respondeu ella. E sahiu, muito contente da vida, rodando o tostão pela sala.

Emquanto isso, dona Benta e tia Nastacia cochichavam na cozinha a respeito do estranho acontecimento.

— Foi cavorteiragem della, sinhá! dizia a preta. Emilia está ficando sabida demais. Juro que foi ella quem escondeu os seus oculos para apanhar os cobres. A gente vê cada coisa neste mundo! Uma bonequinha que eu mesma fiz, e de um panno tão ordinario, tapeando a gente desta maneira! Crédo!...