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CONTOS PARAENSES
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Horas inteiras, de intensíssimo contentamento, eram as que passava ao lado da rapariga, a tecer com ella o gracioso dibuxo da sua risonha existencia por vir, quando, a sós no copiar, de mãos entrelaçadas e o olhar perdido ao longe, nas aquosas sinuosidades esbatidas nas sombras do fundo, compraziam-se em acastellar illusões, n’umas inflorescencias de amplas phantasias admiraveis.

Similhante existencia, parecia abençoal-a o ceu, na sua clemente bondade rejubilada pelo edificante espectaculo de tão acrisolada paixão.

Mas houve um dia em que a sorte, — sempre inclemente e cynica, doutor! — pareceu querer zombar da voz geral, corrente a respeito d’aquella invejavel bonança de duas vidas felicíssimas.

A cabanagem assolava esta parte da provincia. As aguerridas guerrilhas dos revoltosos percorriam sanguisedentas povoados e roças, buscando e fazendo victimas por toda a parte, com o desabrimento impudico da mais ousada barbaridade.

Em taes condições, a casa dos paes de Thomazia não poderia escapar á visita dos desalmados. Esta foi subjeitada á mais torpe violencia que se póde intentar contra uma donzella, e os paes da rapariga, por haverem querido dissuadil-os da infamia, — após assistirem á perpetração selvática do attentado sem nome, soffreram inermes a