— Você não me ouve, Capitú.
— Eu? Ouço perfeitamente.
— O que é que eu dizia?
— Você... você falava de Sirius.
— Qual, Sirius, Capitú. Ha vinte minutos que eu falei de Sirius.
— Falava de... falava de Marte, emendou ella apressada.
Realmente, era de Marte, mas é claro que sé apanhára o som da palavra, não o sentido. Fiquei serio, e o impeto que me deu foi deixar a sala; Capitú, ao pereebel-o, fez-se a mais mimosa das crealuras, pegou-me na mão, confessou-me que estivera contando, isto é, sommando uns dinheiros para descobrir certa parcella que não achava. Tratava-se de uma conversão de papel em ouro. A principio suppuz que era um recurso para desenfadar-me, mas d'ahi a pouco estava eu mesmocalculando tambem, já então com papel e lapis, sobre o joelho, e dava a differença que ella buscava.
— Mas que libras são essas? perguntei-lhe no fim.
Capitú fitou-me rindo, e replicou que a culpa de romper o segredo era minha. Ergueu-se, foi ao quarto e voltou com dez libras esterlinas, na mão; eram as sobras do dinheiro que eu lhe dava mensalmente para as despezas.
— Tudo isto?
— Não é muito, dez libras só; é o que a avarenta de sua mulher poude arranjar, em alguns mezes, concluiu fazendo tinir o ouro na mão.