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MONTEIRO LOBATO

E de tanto pensar num meio de descobrir o Visconde, teve uma idéia luminosa: pedir aos invisíveis sacis do pomar que o procurassem e achassem.

— Isso mesmo! — dizia ela consigo. — O periscópio está consertado. Levo o periscópio ao pomar, descubro os sacis e como eles vivem de cachimbinho na boca, proponho-lhes um maço de cigarros em troca de me descobrirem o Visconde.

Disse e fez. Levou o "Periscópio do Invisível" para o pomar e lá o assestou num monte de esterco onde havia mais de vinte chapéus-de-sapo nascidos na véspera. Espiou pelo binóculo e sorriu para si mesma. "Eu sou uma danada! Lá estão debaixo dos cogumelos uma porção de sacizetes e anõezinhos como os de Branca de Neve. O mundo está cheio de maravilhas que nós não vemos. Junto com as coisas visíveis há as invisíveis — justamente as mais lindas..."

Mas como entender-se com eles e propor o negócio da "achada" do Visconde? "Tenho de prender um saci na garrafa, como fez Pedrinho antigamente e para isso o melhor jeito é armar uma peneira."

"Armar peneira" é coisa muito simples, que qualquer criança da roça costuma fazer no quintal, para pegar passarinhos. Espalha quirera no chão e põe em cima uma peneira emborcada. Depois ergue-a meio palmo dum lado e escora-a com um pauzinho. Amarra nesse pauzinho um barbante comprido e fica de longe, escondida, segurando a extremidade. Os canários e tico-ticos vêm comer a quirera, e quando entram debaixo da peneira basta um puxão no fio. A escora "espirra" e a peneira cai em cima dos passarinhos.

Foi o que Emília fez. Armou a peneira bem em cima dos chapéus-de-sapo e foi ficar com a ponta do barbante na mão, bem longe, lá atrás da pitangueira. E como houvesse levado para lá o periscópio, segurava o barbante e espiava ao mesmo tempo.

Os sacis, que haviam fugido enquanto ela armava a peneira, foram voltando. A princípio estranharam aquilo, mas logo se acostumaram e foram entrando na peneira. Ao ver lá dentro uma meia dúzia, Emilia deu um tranco na linha.