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de poesias suas em que achei muito sentimento e uma grande harmonia. Teria passado toda a noite a escutal-a sem me lembrar de Mauricio que me esperava guardando a meza-jangada, mas a entrada do marido fez cessar o lado poetico para me chamar ao fim material da minha visita. Disse-lhe o que queria e foi combinado que no dia seguinte me venderia e levaria á praia um boi.

Ao romper do dia despedi-me da minha bella poetisa e fui ter com Mauricio. O pobre diabo tinha passado a noite o melhor que poude, mettido entre os quatro toneis, e muito inquieto por meu respeito, receiando que eu tivesse sido devorado pelos tigres, muito communs n’esta parte da America e menos inoffensivos que os cavallos e os touros.

No fim de alguns momentos appareceu o capataz trazendo um boi ao laço. Em poucos momentos o animal foi morto e esquartejado, tal é a habilidade que os homens do sul teem para estas obras de sangue.

Faltava transportar o boi, cortado em pedaços e leval-o para o navio, isto é, a mil passos de distancia, pelo menos, tendo de atravessar os cachopos onde se despedaçavam as ondas furiosas.

Mauricio e eu démos começo á nossa empreza.

Já sabem como era construida a jangada que nos devia conduzir a bordo: uma meza com um tonel amarrado a cada pé, um pau no centro, que vindo do navio, tinha servido para suspender os nossos vestidos, e que voltando devia conduzir os viveres sustentando-os ao de cima da agua.

Deitámos a jangada ao mar, puzemo-nos em cima, e Mauricio com uma vara na mão, e eu com um croque, começámos a manobrar temdo agua até aos joelhos, porque o peso que a jangada levava era excessivo.

A nossa manobra executou-se com grandes applausos do americano e da tripulação da galeota, que fazia ardentes votos, póde ser, não pela nossa salvação, mas sim pela da carne que conduziamos.