Página:Os Fidalgos da Casa Mourisca (I e II).pdf/158

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Jorge não pôde ouvir sem se perturbar estas palavras e, interiormente inquieto, sem bem saber porque, murmurou:

— De certo, mas...

— Ora bem. O snr. Jorge é rapaz sisudo e pacato, mas emfim sempre ha de saber o que são dezoito, dezenove ou vinte annos, hein? Pode-se ter o juizo muito claro, vêr as coisas como ellas são, mas... isto de sangue novo... parece que ferve e depois é como uma doença, e como uma febre, a cabeça desarranja-se e não ha conselhos que a concertem. Pois não é assim?

Jorge córou ouvindo estas considerações de Thomé, que lhe pareciam dirigidas, olhou para elle com desconfiança e respondeu confusamente:

— Talvez seja; porém...

— Ora então segue-se que o melhor é livrar-se a gente de trabalhos e fugir das occasiões, para que depois se não diga: «Ai, porque se eu soubesse; ai, porque o que eu devia ter feito era...» Entende-me?

— Entendo, Thomé, mas, a final a que quer chegar? — interrogou Jorge, cada vez mais sobresaltado.

— Ora eu lhe digo. A minha Bertha é uma rapariga de juizo.

A confusão de Jorge redobrou. O rosto tingiu-se-lhe de rubor, em que Thomé não reparou.


— É — proseguiu o fazendeiro — tenho a certeza d'isso, mas é rapariga, e emfim teve uma educação bem bonitinha; e Deus me perdoe se fiz mal em lh'a dar; ora eu, com quanto seja um rustico, sei o valor que teem certas coisas, e que quem se costumar a ellas com ellas sonha. Isso é que é verdade! E nem eu me admirava de que a pequena tivesse sua inclinação para rapazes da cidade. Era natural, já digo. Mas aqui não veem elles, os da terra são assim meios... meios... emfim rapazes de lavoura, como eu fui; muito bons para raparigas como era a minha Luiza. Ora agora o que por ahi ha, são, e perdoe-me dizer-lhe isto, uns fidalguinhos que não teem que fazer, e que passam o seu tempo a inquietar as raparigas da terra. D'esses é que eu tenho mêdo! E se quer que lhe falle a verdade, cá em rela-