Página:Os Fidalgos da Casa Mourisca (I e II).pdf/374

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— E ha mais tempo seria este o meu logar, se não soubesse que até hoje lhe não faltavam os cuidados de que a sua doença precisa.

— E vens... vens para ficar? — perguntou o doente com uma inflexão de alegria quasi infantil.

— Se me der licença que fique...

— Se te der licença, filha!...

De subito reprimiu a sua expansão de alegria, e emendou em tom mais grave:

— Não, Bertha; não é aqui o teu logar. Eu não sou teu pae.

— Mas é meu padrinho e está doente. E á cabeceira de um doente uma mulher está sempre no seu logar. É o nosso posto de honra — respondeu Bertha, com aquella entonação carinhosa com que as raparigas sabem enfeitiçar o coração e enleiar a vontade dos seus velhos paes e avós.

O fidalgo sorriu com brandura e, passando a mão tremula pelos fartos cabellos de Bertha, disse-lhe, olhando-a com sympathia:

— Mas que dirá teu pae?

A estas palavras Bertha dirigiu para a porta do quarto um olhar indiscreto, olhar que despertou suspeitas no espirito de D. Luiz e o obrigou a seguir com a vista a mesma direcção.

Atravez da porta meio aberta descobriu a figura de Thomé, que ficára no corredor. Uma rapida contracção atravessou como o effeito de um choque electrico a fronte de D. Luiz; em breve porém dissipou-se este signal de desgosto, e com voz serena e sem aspereza interrogou:

— Estava ahi, Thomé da Povoa?

O fazendeiro deu alguns passos no quarto, ainda timidamente, e respondeu volteando o chapéo entre as mãos:

— Estava, sim, fidalgo; fui eu mesmo que acompanhei a rapariga, e se v. exc.ª me quizer fazer o favor de aceitar a companhia d'ella, com muito gosto lh'a deixo ficar. Porque emfim, snr. D. Luiz, isto de mulheres sem-