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cia. A razão, meu pae, diz-nos que é uma vergonha e um crime para os nossos vinte annos a vida ociosa e inutil que passamos aqui.

--Muito bem; querem então meus filhos que eu lhes dê um modo de vida; veem aqui no proposito de arguir-me por me ter descuidado de os... arrumar?

O fidalgo empregou no verbo final, de um sabor burguez, toda a emphase sarcastica, que lhe inspirava a sua irritação e orgulho aristocratico.

--Não, meu pae--insistiu Jorge--vimos apenas lembrar a v. exc.ª que chegamos a uma idade em que já nos não satisfazem os gozos da vida de rapaz, de que o muito amor de v. exc.ª nos tem permittido saciar. Vimos pedir-lhe que nos conceda agora licença de nos occuparmos de outra ordem de ideias e de mudarmos de vida. Sentimos despontar em nós desejos novos, vimos respeitosamente annuncial-o a v. exc.ª e rogar-lhe a permissão para realisal-os.

D. Luiz sorriu ironico, porque não podia ainda tomar a serio a resolução dos filhos, em quem só via duas crianças; e continuou zombando:

--Está bem. Então tu o que queres ser?

Jorge respondeu promptamente:

--Procurador de v. exc.ª na administração da nossa casa.

D. Luiz olhou d'esta vez para o filho mais seriamente, porque lhe causára impressão a firmeza e promptidão da resposta, em vez das titubeações que esperava. Convenceu-se de que Jorge não procedia levianamente de todo, e que n'elle havia uma tenção formada. Voltando-se para Mauricio, interrogou-o, ainda no mesmo tom em que principiára:

--E tu? Queres ir para o Brazil?

Mauricio não tinha, como Jorge, uma resposta prompta, porque n'elle o projecto era apenas uma resolução vaga e mal definida, e não um plano fixo e meditado como o do irmão. Era n'essas fórmas vagas que elle mais o namorava, e talvez ao pretender fixal-o, principiasse a experimentar as primeiras repugnancias e desillusões.