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mas o certo é que lhe metteram na cabeça essas caraminholas e se v. exc.ª não olha por isso, eu lhe protesto que dão com o rapaz mação, o que é uma pena, porque é um bom rapazinho. Mas quando elles me vem com as nobrezas do trabalho aos contos, torço-lhe logo o nariz.

—Parece-me que d'esta vez são sem fundamento os seus receios, frei Januario. A final, pondo de parte alguma expressão menos sensata, e que o verdor dos annos desculpa, as ideias do rapaz são razoaveis.

—Razoaveis?

—Pois porque não? Que quer elle? Occupar em alguma coisa o tempo, que perde na ociosidade. Está cançado da vida de rapaz. É natural e é louvavel. E em que quer elle empregal-o? No que ámanhã será constrangido a fazer, com peior resultado; no que eu devêra ter feito na idade d'elle; em trabalhar, em gerir os bens da sua casa. Mais vale então que principie já, frei Januario, sob a guia dos seus conselhos, do que tarde, ás cegas e sem uma pessoa de confiança a encaminhal-o.

—Pois é verdade, mas…

—Elle fallou-me n'isso ha pouco.

—Ah! pois sempre fez o que disse?!

—Fez, sim, e fez bem. Achei que o rapaz tinha pensado maduramente no caso e dei-lhe a permissão que elle pediu. Era até o que eu tinha para dizer-lhe.

—Então, visto isso, de hoje em diante?…

—De hoje em diante, Jorge se entenderá comsigo. O frei Januario precisa de descançar tambem.

—Eu ainda não estou cançado—resmungou o padre.

—Espero que dará a meu filho todos os esclarecimentos de que elle precise e todos os conselhos da sua muita experiencia.

—Não seja essa a duvida; mas, na verdade…

O relogio do corredor, batendo nove horas, cortou inesperadamente a phrase ao egresso.

Pelos modos a ceia ia tardando.

—Com licença—disse elle, levantando-se—eu vou vêr como correm as coisas na cozinha.