Página:Turbilhão (Coelho Netto, 1919).djvu/205

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Dona Júlia passou o dia em torturas, preocupada com o aluguel da casa. Se um bonde parava perto, logo alarmada, invocava Nossa Senhora, receando a presença do cobrador, temendo o escândalo.

"Que diriam aquelas mulheres da vizinhança, a gorda, principalmente, que ria de tudo?" Dava-lhe maior cuidado a opinião dos vizinhos do que o próprio vexame. Resignava-se a todo sofrimento, mas a idéia de ser tida por uma caloteira, amofinava-a. Lembrando-se, porém, do filho, animou-se. Ele, por certo, já entregara o dinheiro à senhoria, e como até à tarde ninguém aparecesse, tranqüilizou-se.

Até horas altas da noite esteve a pensar, acotovelada à cômoda, diante dos santos, mas, cedendo à fadiga, deitou-se e adormeceu, acordando de madrugada, em sobressalto, como se houvesse sido sacudida por alguém. O seu primeiro pensamento foi para o filho: 'Teria ele entrado? Quem lhe abrira a porta? Felícia..." Levantou-se, foi ao quarto negra que já enrolava a esteira:

— Paulo veio, Felícia?

— Não senhora.

— Não veio!?

— Que eu visse, não, senhora.

Ficou parada à porta do quarto a olhar. Era a primeira vez que o filho pernoitava fora. Que teria acontecido?